Nanocorpos recombinantes como nova estratégia terapêutica contra picadas de serpentes venenosas

AVANÇOS CIENTÍFICOS EM FOCO

Fabiana C. V. Giusti, PhD; Sara Tolouei, PhD e João B. Calixto, PhD

10/31/20252 min read

Introdução

As picadas de cobra são um grave problema de saúde pública em regiões tropicais, especialmente na África Subsaariana, onde causam cerca de 20 mil mortes e 10 mil amputações por ano. Os antivenenos tradicionais são obtidos a partir do plasma de cavalos previamente imunizados com pequenas doses de veneno. Embora eficazes, esses produtos apresentam várias limitações: são geralmente específicos para uma única espécie de serpente, podem provocar reações imunológicas adversas e não conseguem evitar a necrose local provocada pelos venenos.

O que os pesquisadores demonstraram

Um estudo conduzido por cientistas do Instituto Técnico da Dinamarca publicado na revista Nature revelou o desenvolvimento de um novo antiveneno capaz de neutralizar o veneno de 17 espécies diferentes de serpentes africanas altamente venenosas, incluindo cobras, mambas e rinkhals.

Os pesquisadores imunizaram uma alpaca e uma lhama com venenos de 18 espécies de serpentes africanas. A partir desses animais, isolaram nanocorpos - pequenas versões de anticorpos capazes de penetrar nos tecidos e se ligar com alta afinidade às toxinas destrutivas do veneno. Oito desses nanocorpos foram combinados em um único coquetel experimental. Quando administrado em camundongos previamente envenenados, o antiveneno recombinante neutralizou com sucesso os venenos de 17 das 18 espécies testadas e reduziu significativamente o dano cutâneo, superando o desempenho do antiveneno comercial Inoserp PAN-AFRICA.

O trabalho demonstra que um número relativamente pequeno composto de apenas 8 anticorpos é suficiente para alcançar ampla cobertura contra múltiplas espécies de serpentes, contrariando a crença de que seriam necessários centenas de anticorpos diferentes para obter um antiveneno de espectro amplo.

Apesar dos resultados promissores, os autores observam que os nanocorpos têm uma meia-vida curta no organismo, o que pode exigir ajustes na formulação para uso em humanos e animais de maior porte. Mesmo assim, especialistas destacam que a capacidade dessa nova geração de antivenenos em prevenir não apenas a morte, mas também a destruição tecidual, representa um avanço significativo no tratamento de envenenamentos por serpentes.

As conclusões e perspectivas do estudo

Em conclusão, o estudo demonstra a viabilidade de desenvolver antivenenos recombinantes de nova geração, mais seguros, estáveis e acessíveis. Essa estratégia pode transformar o tratamento de envenenamentos, reduzir mortes e amputações, e servir de modelo para terapias baseadas em anticorpos aplicáveis a outras doenças tropicais e condições complexas que requerem neutralização de múltiplas toxinas ou alvos biológicos.