Células CAR-T geradas no próprio organismo ajudam os primeiros pacientes com câncer

AVANÇOS CIENTÍFICOS EM FOCO

Fabiana C. V. Giusti, PhD; Sara Tolouei, PhD e João B. Calixto, PhD

12/10/20252 min read

Artigo de Mitch Leslie publicado na News from Science descreve como os pesquisadores deram um passo importante rumo a uma nova geração de terapias celulares contra o câncer: pela primeira vez, pacientes foram tratados com células CAR-T produzidas diretamente dentro do próprio organismo, sem a necessidade de manipulação laboratorial. Os primeiros resultados de dois ensaios clínicos em pacientes com mieloma múltiplo - um tipo de câncer do sangue - mostram que essa estratégia pode funcionar, trazendo respostas profundas e rápidas.

Tradicionalmente, a terapia CAR-T envolve retirar células T do paciente, modificá-las em laboratório para que expressem um receptor especial capaz de reconhecer células tumorais (o CAR) e depois reinfundi-las. Esse processo é muito trabalhoso pois leva semanas, é caro e, em alguns casos, o paciente não sobrevive até a conclusão do tratamento. Produzir as células CAR-T diretamente no corpo (in vivo) pode eliminar essas limitações e revolucionar essas terapias.

Nos dois estudos apresentados, os pacientes receberam um lentivírus geneticamente modificado contendo o gene do CAR. Esse vírus se liga às células T circulantes e insere nelas o DNA necessário para que passem a reconhecer e destruir células cancerígenas.

No primeiro ensaio, divulgado em julho, quatro pacientes tratados apresentaram respostas importantes. Em dois deles, as células malignas desapareceram completamente da medula óssea após três meses; nos outros dois, desapareceram em dois meses. Dois pacientes também tiveram regressão de tumores fora da medula - algo difícil de alcançar com terapias convencionais. No entanto, ocorreram efeitos colaterais como queda de pressão, necessidade de oxigênio suplementar e episódios de confusão mental, embora todos tenham se recuperado.

No segundo estudo, apresentado no congresso da Sociedade Americana de Hematologia, quatro pacientes tratados com outro lentivírus também tiveram eliminação completa das células tumorais da medula após um mês. Os efeitos adversos foram mais leves, incluindo apenas casos moderados de síndrome de liberação de citocinas, manejáveis com tratamento.

Apesar do entusiasmo, especialistas alertam que é cedo para conclusões definitivas. Lentivírus se integram ao DNA das células, o que pode representar risco de indução de câncer a longo prazo. Esses pacientes precisarão ser acompanhados por anos. Outras abordagens, como nanopartículas lipídicas semelhantes às usadas em vacinas de COVID-19, estão sendo testadas para fornecer mais segurança.

Mesmo assim, os avanços sugerem que a terapia CAR-T produzida no próprio corpo pode tornar o tratamento mais rápido, acessível e eficaz. Segundo os pesquisadores, “os pacientes têm motivos para otimismo”.